A inteligência artificial no direito é a tecnologia com maior potencial de transformar a sociedade. Incontáveis são os seus benefícios e ainda indefinidos são todos os riscos que ela pode causar. Fato é que nenhuma pessoa física ou jurídica, pública ou privada, escapará dos reflexos dessa inovação e da tecnologia principalmente no direito.
O segmento jurídico será um dos mais impactados pela transformação provocada pela inteligência artificial. Primeiro, porque está baseado em informações. Contratos e processos carregam em si um gigantesco conjunto de dados, portanto, há matéria-prima. E segundo, porque os benefícios dessa tecnologia, como aumento de produtividade, economia e predição, atingem todos os agentes do segmento, com ênfase para os tribunais e os advogados.
Acontece que as primeiras notícias desta conexão inteligência artificial + Direito foram sensacionalistas e não contribuíram para uma análise mais completa sobre essa relação. Manchetes como “O fim dos advogados” e “O robô que substitui o juiz” são apenas alguns exemplos que circularam em todos os meios de comunicação, inclusive em canais não especializados.
Do outro lado, inúmeros casos reais apresentados por tribunais, empresas e escritórios revelaram um cenário colaborativo que deve nortear esta relação, o caminhar junto, homem e máquina, com resultados incríveis. Novas atividades, maior eficiência e celeridade e, principalmente, humanos realizando tarefas não repetitivas e que não valorizam sua capacidade criativa.
Para contextualizar e provocar reflexões preliminares, a seguir serão apresentados dez motivos para que seja feita uma real conexão entre o Direito, a tecnologia e a inteligência artificial:
1
A inteligência artificial já tem sido utilizada pelos tribunais e demais órgãos públicos. Não se questiona mais “será que o Judiciário aceitará os robôs?”. O exemplo mais conhecido é o robô Victor desenvolvido pelo Supremo Tribunal Federal;
2
Advogados de empresas e escritórios têm ferramentas de análise preditiva, pelas quais é possível estimar o resultado do processo com base no histórico de processos semelhantes;
3
Novas demandas jurídicas consultivas decorrentes da inteligência artificial precisarão ser analisadas por advogados. Novos contratos, políticas de uso e pareceres serão demandados pelos clientes;
4
Como as demandas que chegam ao Judiciário refletem as relações sociais, novas demandas jurídicas contenciosas serão levadas aos tribunais. É questão de tempo para que a Justiça analise casos sobre discriminação algorítmica;
5
O compliance digital, especialmente relacionado à aplicação da inteligência artificial, ainda está sendo construído. Códigos de conduta serão atualizados com novas regras, e empresas com larga atuação em tecnologia certamente criarão um código específico para tratar da utilização da inteligência artificial no direito;
6
A regulamentação da inteligência artificial demandará participação efetiva da sociedade. Muitas aplicações de inteligência artificial são polêmicas. Além de uma lei geral, segmentos regulados terão legislações específicas;
7
A inteligência artificial já tem sido aplicada aos métodos adequados de solução de conflito. E estudos recentes indicam novas utilizações desta tecnologia inclusive na arbitragem, como por exemplo, a escolha dos árbitros por algoritmos;
8
As últimas eleições atestaram o que havia sido antecipado por cientistas políticos: a aplicação da inteligência artificial no processo eleitoral reconfigurou a democracia;
9
O ensino jurídico precisará ser atualizado. Cada vez mais o profissional que atua na área jurídica será multidisciplinar. Advogados, juízes e demais operadores do Direito precisarão conhecer as leis materiais e processuais, lógica de programação e conhecimento em tecnologia e direito;
10
O marketing jurídico, aqui representado pelo relacionamento entre advogado e cliente, terá uma nova dinâmica. Basta projetar eventual diferença entre o resultado efetivo do processo e a análise preditiva realizada no momento da contratação.
Todos os tópicos, sem exceção, ainda estão em construção. E outros tantos pontos poderiam ser inseridos na relação. Certo é que a aplicação da inteligência artificial no Direito, assim como em qualquer outro segmento, é inevitável. A comunidade jurídica será responsável por criar um ambiente propício à inovação, estabelecendo como padrão a participação conjunta do homem e da máquina, superando, assim, os limites humanos.
*Ricardo Freitas Silveira é advogado e sócio da Lee, Brock, Camargo Advogado (LBCA).
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